Grupo de Trabalho criado no âmbito dos MPs fiscalizará precatórios do Fundeb/Fundef

Grupo de Trabalho criado no âmbito dos MPs fiscalizará precatórios do Fundeb/Fundef

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou em segundo turno na noite de terça-feira (9.11), a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos Precatórios. A proposta prevê folga de R$ 91,6 bilhões no Orçamento Federal de 2022, na medida em que deixa de pagar 50% dos precatórios previstos no orçamento público para o ano. A PEC agora será apreciada pelo Senado.

O Ministério Público de Contas (MPC) brasileiro passou a integrar recentemente Grupo de Trabalho Interinstitucional, que tem como objetivo justamente fiscalizar as verbas dos precatórios do Fundeb/Fundef.

Este Grupo é coordenado pela Procuradora Chefe do MPF de Alagoas,  República, Niedja Kaspary, que concedeu ao site da AMPCON entrevista detalhando ações e foco de trabalho do grupo.  

Qual a preocupação dos MPs com a questão do uso de verbas originadas dos precatórios em relação à educação?

Niedja Kaspary - Em decorrência de Ação Civil Pública promovida pela Procuradoria da República no Estado de São Paulo (autos nº 1999.61.00.050616-0), foi reconhecido, por sentença transitada em julgado, o direito de alguns municípios à complementação dos valores do Fundef pagos a menor pela União, referentes ao período de 1998 a 2006.

Tais recursos, garantidos pelo sucesso da ACP acima mencionada, já estão disponíveis por meio de precatórios aos estados que faziam jus, à época, à complementação da União, sendo necessário para o seu efetivo recebimento a simples execução da sentença em cada localidade.

Todavia, apesar da baixa complexidade jurídica da ação, diversos municípios contrataram, sem licitação, escritórios de advocacia para recuperação de tais valores, utilizando parte dos recursos do fundo para pagamento de honorários advocatícios, prática posteriormente julgada irregular pelo Supremo Tribunal Federal. Além disso, alguns municípios estão aplicando ou pretendem aplicar tais recursos em finalidades distintas à manutenção e ao desenvolvimento da educação, sendo essas as preocupações primordiais do Ministério Público brasileiro.

De que forma agirá nacionalmente o Grupo de Trabalho criado?

Niedja Kaspary - A 1ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF promoveu, no dia 21 de agosto de 2018, reunião de alinhamento entre MPF e MPs Estaduais sobre verbas precatórias do Fundeb. Durante o evento foi assinado memorando de entendimento reafirmando como prioridade do Ministério Público brasileiro zelar pelo cumprimento da sentença judicial em ação civil pública, a qual determinou a aplicação exclusiva das verbas do Fundeb em serviços de educação.

Também, como resultado da reunião de alinhamento, deliberou-se pela criação de um Grupo de Trabalho Interinstitucional para compartilhamento de iniciativas e diretrizes que garantissem a aplicação desses recursos no desenvolvimento da educação básica.

A atualidade, a complexidade e a magnitude da temática são evidenciadas pelo débito de cerca de R$ 90 bilhões da União em relação a mais de 3.800 Municípios e Estados brasileiros para fins de complementação de verbas do atual Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos profissionais da educação (Fundeb, antigo Fundef).

Nesse cenário, a atuação ministerial para fiscalização das verbas de educação compreende iniciativas conjuntas na área judicial, extrajudicial e administrativa, que incluem propositura de diversos remédios jurisdicionais, realização de ação coordenada em nível nacional, expedição de recomendações a municípios, articulação interinstitucional, entre outras ações.

O atual Grupo de Trabalho, renovado em 2021, é um aprofundamento desse escopo originário, maximizando a integração dos Ministérios Públicos de Contas, com sua reconhecida expertise em prol da correta aplicação dos recursos públicos.

A intenção inicial do novo Grupo de Trabalho é atualizar o Roteiro de Atuação Fundef/Fundeb para adequá-lo aos termos das alterações normativas posteriores, principalmente as promovidas pela Lei nº 14.113/2020.

É possível assegurar o cumprimento ou a priorização do ponto de vista legal?

Niedja Kaspary - Sim. Para cumprimento do arcabouço normativo em vigor, já foram expedidos mais de 500 recomendações e firmados mais de 25 Termos de Ajustamento de Conduta ao redor do país, sempre priorizando uma atuação integrada entre os Ministérios Públicos Federal, dos Estados e de Contas, além da aproximação com o Tribunal de Contas da União e Controladoria-Geral da União. A partir daí, a forma de atuação é diversa, a depender da situação de cada município.

Nas localidades onde ainda não houvesse providências para a recuperação dos recursos do antigo Fundef, os gestores receberiam recomendações com orientações sobre como receber e aplicar a verba, além de alerta específico sobre a ilegalidade da contratação de escritórios de advocacia para a recuperação desses valores. Caso o município já tivesse recebido os valores devidos, caberia a celebração de um Termo de Ajustamento de Conduta no qual a prefeitura se comprometeria a aplicar o dinheiro exclusivamente na manutenção e desenvolvimento da educação do município.

Por fim, caso já houvesse contratação de escritório de advocacia com previsão de pagamento de honorários advocatícios, a recomendação seria a suspensão dos pagamentos e anulação do contrato, sob pena de ajuizamento de ação civil para esse fim.

O saldo desse trabalho poderá deixar resultados efetivos para a sociedade?

Niedja Kaspary - A partir dessa atuação integrada e das orientações do Roteiro de Atuação Fundef/Fundeb - iniciativas que já vêm produzindo frutos -, o grupo de trabalho espera a efetiva aplicação dos recursos para a manutenção e desenvolvimento do ensino, com o repasse integral dos percentuais das verbas estabelecidos em lei e a vinculação da verba recebida exclusivamente à educação básica.

De que modo você avalia a proposta do governo em pagar os precatórios relacionados à educação durante os 3 próximos anos?

Niedja Kaspary - Não obstante os avanços do Fundeb, os recursos destinados à educação pública não são suficientes diante da necessidade de estrutura física, alimentação, transporte, capacitação, valorização do magistério, entre outros aspectos. Diante de um cenário de dotações orçamentárias crescentemente constrangidas, os recursos dos precatórios do antigo Fundef consistem num importante incremento de investimento em educação, de modo que o protelamento do seu pagamento prejudica os cidadãos dos municípios, especialmente estudantes e professores.

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