O último painel do XVI Congresso Nacional do Ministério Público de Contas (CNMPC) convidou à reflexão sobre o impacto das ferramentas de inteligência artificial generativa no Judiciário e no Ministério Público. A mediação ficou a cargo do Desembargador do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, Flávio Boson Gambogi, e o destaque do debate foi o Desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Alexandre Freire Pimentel.
O Painel sobre Inteligência Artificial, contou com a palestra do Desembargador Alexandre Freire Pimentel e mediação do também Desembargador, Flávio Boson Gambogi. Foto: Alexandre Rezende
Em sua exposição, Pimentel abordou a trajetória histórica da inteligência artificial, desde os experimentos de 1943 de Warren McCulloch e Walter Pitts, que simulavam redes neurais a partir do comportamento cerebral humano, até os ramos atuais: a inteligência artificial clássica, baseada em lógica, e a inteligência computacional, inspirada em processos da natureza, como a sequência de Fibonacci e o comportamento coletivo de formigas, utilizado no desenvolvimento de algoritmos de redes sociais.
Flávio Boson Gambogi durante mediação do painel. Foto: Alexandre Rezende
O Desembargador destacou que o uso seguro da IA exige planejamento e supervisão humana rigorosa. Ele citou o exemplo do seu gabinete, onde desenvolveu o sistema de automação Veritas, que gera radiografias detalhadas das demandas processuais, permitindo identificar a distribuição das ações por área, como bancos, família e sucessão.
“Esse diagnóstico facilitou a gestão e nos ajudou a zerar o gabinete com apoio da inteligência artificial. Cada passo é supervisionado por revisões humanas, garantindo segurança e coerência nas decisões”, explicou.
Alexandre Freire Pimentel durante sua palestra. Foto: JK Freitas
Em seguida, Pimentel demonstrou a ferramenta Maia, desenvolvida em parceria com a Universidade Católica de Pernambuco e a Universidade de Pernambuco (UPE). A Maia importa processos do Codex, o Big Data do Judiciário brasileiro, que já reúne mais de 9 bilhões de decisões. A IA realiza a análise FIRAC (Fatos, Issues, Regras, Análise e Conclusão), resumindo processos, identificando questões jurídicas centrais, sugerindo legislação aplicável e comparando casos com decisões anteriores.
“A Maia me mostra que um caso tem 83,47% de similaridade com outro que já julguei. Isso ajuda a manter coerência decisional e evitar contradições”, afirmou.
O sistema permite gerar relatórios, rascunhos de votos e minutas de acórdãos, obedecendo aos formatos definidos pelo CNJ, sempre com revisão humana em múltiplas etapas. Pimentel destacou que cada assessor do gabinete elabora, em média, três minutas diárias, e explicou como os prompts personalizados, alguns com até 22 páginas, orientam a IA para produzir decisões seguras e consistentes.
“Ela me obedece na maioria das vezes, mas às vezes se rebela. É por isso que insistimos em múltiplas camadas de revisão humana. A IA é um apoio, não um substituto”, completou.
O Desembargador também enfatizou a importância da Regulação da IA no Judiciário, citando a Resolução nº 615 do CNJ, que regulamenta o uso da inteligência artificial generativa, e o futuro acesso ao Banco Nacional de Precedentes (BNP), para evitar riscos de “alucinações” jurisprudenciais.
“Com acesso ao BNP, conseguiremos checar a autenticidade da jurisprudência diretamente na fonte, garantindo mais segurança às decisões automatizadas”, concluiu.
Pimentel finalizou destacando o potencial transformador da tecnologia, alertando para o cuidado necessário e reforçando que a IA deve ser usada como ferramenta de apoio, sempre alinhada à supervisão humana e à ética judicial.
Elke Moura entrega certificado aos painelistas. Foto: Alexandre Rezende