Documentos obtidos pelo MPC-PR revelam que PM, durante protesto, deu 20 tiros por minuto

Há exatamente um mês, a Polícia Militar do Paraná usava 2.323 balas de borracha contra os professores e outros servidores do Estado que protestavam contra um projeto do governo Beto Richa (PSDB).

Criticada até no exterior, a ação policial resultou em ao menos 180 pessoas feridas.

Na média, foram quase 20 tiros por minuto, considerando as duas horas de duração da operação ordenada pelo tucano.

Os dados foram divulgados num ofício da PM enviado nesta quinta-feira (28) ao Ministério Público de Contas.

A operação custou ao governo Richa R$ 948 mil no total, gastos em munições e diárias pagas para deslocar policiais do interior para Curitiba.

O objetivo da ação era impedir a invasão da Assembleia Legislativa por cerca de 15 mil manifestantes –a maioria professores–, que protestavam contra a votação de mudanças na previdência dos servidores estaduais.

Uma ordem judicial impedia a entrada no prédio.

O projeto acabou aprovado naquele mesmo dia, enquanto bombas de gás e balas de borracha eram lançadas contra o protesto.

Segundo o ofício da PM, no total, 1.661 policiais participaram da operação –o equivalente a 15% de todo o efetivo do Estado.

Metade deles veio do interior –daí a necessidade das diárias, de R$ 230 por policial, para cobrir despesas com alimentação e hospedagem.

Além dos custos com 2.323 balas de borracha, a PM gastou ainda para comprar 1.094 granadas e outros 300 projéteis lacrimogêneos de longo alcance.

Algumas das balas usadas naquele dia disparavam até 12 projéteis de borracha de uma só vez.

No caso das granadas, a maioria era de efeito moral ou lacrimogênea.

Cem delas tinham efeito "luz e som", ou seja, emitiam um forte ruído e uma luz intensa quando detonadas, capaz de ofuscar a visão.

Outras 43 eram mais agressivas: continham "múltiplas esferas internas de borracha", além de gás lacrimogêneo ou de pimenta.

Ou seja, ao explodirem, lançavam balas de borracha contra os manifestantes –nesse caso, aqueles que estivessem protegidos por barricadas ou escudos improvisados, segundo a orientação do fabricante.

Algumas ainda eram tríplices, com três pastilhas de emissão de gás lacrimogêneo.

O objetivo, nesse caso, é dificultar que sejam lançadas de volta contra os policiais.

Apesar de a ação policial ter gerado críticas até do PSDB contra o governo do PR e enorme constrangimento a Richa, a PM foi defendida inicialmente pelo tucano.

Depois, porém, ele chegou a pedir desculpas à população, em entrevista exclusiva à Folha, na qual disse "não ter ninguém mais ferido do que" ele após a ação.

Até a base do tucano se queixou de Richa, que teria "se isolado" demais no início deste segundo governo –ele foi reeleito no ano passado, com vitória já no primeiro turno.

Depois do episódio, apelidado pelos servidores estaduais de "massacre dos professores", a crise econômica de Richa se transformou também em política.

Três membros do primeiro escalão de sua equipe caíram –entre eles, o então comandante-geral da PM, coronel Cesar Vinicius Kogut, e o secretário de Segurança, Fernando Francischini.

Kogut, que se desentendeu publicamente com Francischini, afirmou à época que a corporação adotou "procedimentos comuns em todas as polícias no mundo", com base no uso progressivo da força, e que reagiu ao rompimento do bloqueio.

"A missão era cumprir uma ordem judicial.

Não queríamos ferir ninguém." Segundo o governo, 20 policiais ficaram feridos na ação.

Do outro lado, foram pelo menos 160.

O Ministério Público de Contas pretende investigar a legalidade e legitimidade das despesas na operação.

Já o Ministério Público Estadual conduz um inquérito para apurar eventuais excessos no episódio e identificar seus responsáveis.

A expectativa do órgão, que já ouviu 294 pessoas e requisitou 204 laudos de lesões corporais, é concluir as investigações até o final de junho.

A origem do ato de um mês atrás está no projeto de Richa que modificou a previdência dos servidores estaduais no PR.

Apesar do protesto, deputados aprovaram a medida naquele mesmo dia.

Sindicatos dos funcionários eram contra o projeto, alegando que a medida do governo afetaria, a médio prazo, a sua aposentadoria.

Para o governo, a medida é necessária para aliviar gastos da ordem de R$ 1,7 bilhão por ano.

Em crise financeira, o governo do Paraná fechou o ano devendo mais de R$ 1 bilhão a fornecedores.

Conforme mostrou reportagem da Folha, porém, a medida é paliativa : alivia o deficit financeiro momentaneamente, mas reduz a expectativa de vida dos fundos previdenciários.

Para especialistas, a mudança deveria vir acompanhada de um sistema de previdência complementar, a fim de garantir os pagamentos de aposentadorias no futuro.

FONTE: Folha de São Paulo